A atuação dos players no mundo do futebol exige cada vez mais conhecimento especializado e, principalmente, celeridade na solução de eventuais conflitos que possam surgir. Por isso, a cada dia cresce a procura pela Câmara Nacional de Resolução e Disputa (CNRD) pelos atores do direito desportivo.
A justiça comum não é a instância mais adequada para lidar com os litígios desportivo, como bem asseverou Alvaro Melo Filho:
“A própria categorização do desporto como ordem jurídica específica decorre de duas condições substanciais: de um lado, da prerrogativa de criar suas próprias regras e, de outro, do exercício do poder de sanção, avultando aqui a função da Justiça Desportiva de ajudar a moldar formas legítimas às práticas do desporto” [1]
Criação e atuação:
Diante desse cenário, em 2016 foi constituída a Câmara Nacional de Resolução de Disputas (CNRD) da CBF, um órgão especializado em solução de litígios desportivos.
Assim, no dia 16.07.2020, foi publicado o 1° Boletim da Câmara Nacional de Resolução de Disputas[2] pela CBF. Nele, a CNRD divulgou os seus números e os principais entendimentos acerca de matérias recorrentes nos casos em que atua.
Destaca-se que 52% dos casos julgados pela Câmara são referentes a litígios entre intermediários x atletas. Ou seja, tais dados apenas demonstram a importância dos jogadores possuírem assessoria jurídica pessoal para a defesa de seus interesses. (https://www.mmaadvocacia.com.br/2020/05/27/importancia-advogado-desportivo-atleta-profissional/).
Importante explicar que havendo cláusula de arbitragem elegendo a CNRD como foro, a Câmara atua como tribunal arbitral e sua sentença tem a natureza de sentença arbitral.
No entanto, não havendo convenção de arbitragem, a CNRD atua nos limites da esfera associativa, de modo que sua decisão pode resultar na aplicação de sanções esportivas, mas não forma título executivo ou produz os outros efeitos de uma sentença arbitral.
Neste sentido, destacam-se alguns entendimentos:
A aplicação de multa por quebra de exclusividade:
A CNRD tem analisado casos que debatem as multas por extinção de contratos de intermediação por quebra de exclusividade.
Para a Câmara, restou claro que o art. 412 do Código Civil não impede que as multas tenham valor superior ao das comissões que, por contrato, o intermediário teria direito a receber.
Ou seja, para a CNRD, a análise sobre a obrigação principal no contrato de intermediação não pode se limitar apenas ao cálculo das comissões devidas sobre os salários em vigor. Ainda de acordo com o publicado, entende-se que a prestação a que o intermediário se obriga compreende um serviço contínuo, que requer planejamento, dedicação e diligência, e que se destina a proporcionar ao atleta remunerações que podem alcançar enorme monta no futuro – tendo valor econômico de difícil mensuração.[3]
A responsabilidade do atleta pela assinatura de documentos sem a devida cautela:
Outro tema bastante recorrente é a falta de diligência do atleta na assinatura de contrato de representação com intermediário.
Na maioria das vezes, o atleta deixa de ler o documento, confiando excessivamente no intermediário. No entanto, a CNRD entende que ele é responsável inteiramente pelos documentos que assinam sem ler.[4]
Não se aplica a multa prevista em favor do intermediário para o atleta:
É comum que os contratos de representação prevejam apenas multas unilaterais no caso do rompimento da avença pelo atleta.
Nesta perspectiva, a CNRD entende que caso o rompimento se dê pelo intermediário, não se aplica referida multa em favor do atleta se não for expressamente previsto em contrato.
A Câmara fundamenta seu entendimento no fato de que o descumprimento do contrato de representação gera consequências distintas para o intermediário e para o atleta.
Assim, eventual multa prevista para rescisão em face do atleta não pode ser invocada a favor do mesmo caso a rescisão se dê por culpa do intermediário, se o contrato assim não dispor[5].
Uso de intermediário não registrado:
À luz do RNI, os clubes, atletas e treinadores não podem utilizar serviços de intermediação prestados por pessoa não registrada na CBF.
A esse respeito, a CNRD já sancionou todas as partes envolvidas numa operação por infração à tal regra.[6]
Recebimento de comissão por parte do intermediário:
Entende a CNRD que o intermediário deve provar que efetivamente prestou serviços em determinada operação para que tenha direito ao recebimento da respectiva comissão. Ou seja, aplica-se a Teoria da Causa Efetiva para que os agentes possam cobrar tais valores.
Destarte, o intermediário deve, então, comprovar que sua atuação foi determinante para que o negócio fosse feito. Apenas neste caso é que tem direito ao recebimento das comissões que lhe sejam devidas.
Caso contrário, em que o intermediário tenha apenas participado de alguma forma que não seja essencial para a conclusão do negócio, não há fundamento para o recebimento da comissão.
Deste modo, conclui-se, diante do exposto, a importância da assessoria jurídica especializada para o atleta, principalmente com atuação preventiva. Desta feita, evita-se litígios ou controvérsias sobre o instrumento, além de impedir que o atleta de assine contrato prejudicial ou excessivamente oneroso.
[1] FILHO, Álvaro Melo. Nova Lei Pelé Avanços e Impactos.
[2] https://www.cbf.com.br/a-cbf/informes/index/credibilidade-faz-cnrd-chegar-a-560-casos-em-menos-de-quatro-anos
[3] Proc. 2017/I/044
[4] Proc. CRL 2015/I/011
[5] Proc. 2017/I/051 CNRD
[6] Procs. 2016/DRT/002 e 2016/ DRT/003